Foto: Governo do Estado/Divulgação

O surgimento de casos de gripe aviária em aves no Brasil nas últimas semanas acendeu o alerta de especialistas.
Para entender sobre os riscos da doença Paulo Viana entrevistou a virologista, professora da Universidade de São Paulo e Presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Helena Lage Ferreira.

1: O que é e onde surgiu a H5N1?

As aves silvestres são consideradas os reservatórios naturais dos vírus influenza aviários, que acometem aves e esporadicamente mamíferos. A primeira identificação do vírus da influenza aviária H5N1 ocorreu em 1996 em gansos domésticos na China.

O vírus possui uma patogenicidade variável de acordo com as espécies de aves e em 2005 começou a ser disseminado com a movimentação da migração das aves, especialmente aquelas que não ficam doentes. O vírus sofreu sucessivas mudanças e o subtipo responsável por esta grande epizootia surgiu na Europa durante o outono de 2020 e se espalhou pela Europa e pela África, Oriente Médio, Ásia e Américas.

2: Humanos podem pegar a gripe aviária?

Sim, as pessoas podem se infectar esporadicamente especialmente pelo contato com aves domésticas e silvestres infectadas ou com o ambiente contaminado com o vírus. Por isso, deve ser evitado o contato com os animais potencialmente infectados sem o treinamento adequado e a utilização de EPIs. As pessoas não devem tocar nos animais e precisam comunicar o Serviço Veterinário Oficial (SVO) ou o sistema e-sisbravet, caso seja observada alguma ave doente.

3: Como ocorre a transmissão desse vírus?

O vírus é eliminado nas secreções do trato digestivo, respiratório e oral das aves infectadas. Algumas espécies são capazes de eliminar o vírus por até 14 dias, mesmo não apresentando sinais clínicos da doença. As aves suscetíveis entram em contato com os vírus, mesmo que em baixas quantidades, e o vírus começa a se replicar nos diferentes órgãos das aves, causando uma infecção grave com sinais respiratórios, neurológicos, reprodutivos e digestórios, na maioria das espécies de aves.

3: Quais os sintomas nas pessoas?

Os sinais clínicos da doença em pessoas são parecidos com a gripe sazonal, como febre (mais nem sempre presente), e algum outro sinal como: tosse, conjuntivite, diarreia, dor de cabeça, dor de garganta, dor muscular, dualidade de respirar; A doença pode se agravar, por isso, após uma exposição, as pessoas precisam entrar em contato com o serviço de saúde local.

A nota técnica do Ministério da Saúde (N 35/2023) recomenda que as equipes de saúde desencadeiem ações de investigação e prevenção de acordo com os casos confirmados de influenza aviária em aves, uma vez que a infecção esporádica de pessoas expostas às aves infectadas pode ocorrer. Portanto, a comunicação entre as equipes envolvidas no atendimento das aves e as equipes de saúde é muito importante.

4: Quais os sintomas nas aves?

O vírus da influenza H5N1 de alta patogenicidade pode desencadear sinais clínicos variáveis de acordo com a espécie e a idade das aves infectadas. Algumas espécies, como alguns patos, marrecos, gansos domésticos, maçaricos e gaivotas podem não apresentar sinais clínicos.

Enquanto outras espécies de aves domésticas como galinhas e perus, e também silvestres, são muito sensíveis à infecção pelo vírus e podem apresentar uma alta taxa de letalidade (em alguns casos até 100%), sinais clínicos como apatia, secreção nasal e ocular, conjuntivite, dificuldade de locomoção, paralisia das asas, torcicolo, tremor de cabeça, opistótono, diarreia, e aves de postura podem também apresentar queda de postura, alterações na formação e coloração da casca dos ovos.

4: Humanos passa para humanos?

Os vírus da gripe aviária, como o H5N1, ainda não possuem a capacidade de transmissão sustentada entre humanos, resultando em uma baixa probabilidade de propagação entre pessoas. Portanto, sem casos confirmados de transmissão de pessoa para pessoa, a Organização Mundial de Saúde (OMS) deve manter o risco apresentado por esse vírus para a população em geral como baixo.

5: Quem corre mais risco?

As pessoas em contato com aves ou mamíferos silvestres doentes. Por isso, a recomendação é que se evite o contato com os animais potencialmente infectados sem o treinamento adequado e a utilização de EPIs. As pessoas não devem tocar nos animais e precisam comunicar ao serviço veterinário oficial municipal, estadual, federal ou eletronicamente pelo e-sisbravet (https://sistemasweb4.agricultura.gov.br/sisbravet/manterNotificacao!abrirFormInternet.action)

Caso haja uma exposição, elas precisam entrar em contato com o serviço de saúde local e ficar vigilância em relação aos sinais clínicos da doença durante 10 dias.

6: Posso pegar H5N1 comendo carne?

As pessoas precisam evitar o contato com aves silvestres, porque vírus não foi encontrado em aves comerciais. É seguro sim comer carne de aves e os ovos cozidos adequadamente, que garante a segurança não apenas contra o vírus da influenza aviária, mas também contra outras bactérias e vírus.

7: Há vacinas para humanos?

Sim, como é um vírus que circula há alguns anos em aves e já infectou 868 pessoas de 2003 a 2023, com uma taxa de letalidade de 53%, a Organização Mundial de Saúde possui algumas estirpes vacinais para que os países consigam se preparar para uma eventual adaptação do vírus.

No Brasil, o Instituto Butantan possui algumas estirpes vacinais cedidas pela Organização Mundial de Saúde e estas vacinas estão em fase de produção dos bancos virais para iniciarem em breve os testes pré-clínicos. Além disso, há também antivirais que são eficazes para o tratamento no início da infecção com este vírus circulante.

8: Há vacinas para aves?

Existe uma grande variedade de vacinas para as aves comercializadas por multinacionais. As vacinas precisam ser avaliadas para que sejam eficazes aos vírus que estão atualmente circulando e há uma grande discussão sobre a utilização das vacinais e as implicações comerciais.

Temos experiências de outros países que mostram que a utilização da vacina não pode ser a única forma de controle do vírus. Ela é sim uma medida adicional de proteção, mas que deve ser acompanhada de outras medidas, incluindo o monitoramento genômico, para acompanhar as infecções e evolução do vírus.

9: Qual é o principal fator de contaminação entre as aves?

As aves se infectam pelo contato direto com outras aves infectadas ou pelo contato indireto com objetos ou ambientes contaminados com partículas virais.

10: Qual é a principal preocupação do vírus o Brasil? O que o Brasil tem feito?

O Ministério da Agricultura (MAPA) tem realizado a vigilância passiva, ou seja o monitoramento de aves silvestres com sinais clínicos ou com mortalidade, em colaboração com os programas de monitoramento de Praias (PMP), Contato dos Centros de Triagens (CETAS) e dos Centros de Recuperação (CRAS).

A Vigilância ativa, ou seja, dos animais assintomáticos, é realizada especialmente em colaboração com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) pela rede PREVIR e por pesquisadores nas instituições de ensino e pesquisa para a identificação precoce do vírus nas diferentes regiões do País e permitir que o setor avícola se organize.

O Brasil é o segundo maior produtor e maior exportador de carne de frango no mundo. A introdução do vírus em criações de aves comerciais é uma grande preocupação por causa dos grandes prejuízos sócios econômicos, impactos à saúde, aos meios de subsistência, à segurança alimentar e nutricional e ao comércio de produtos.

Por isso, é uma situação que exige o monitoramento e o trabalho coordenado de todos os profissionais do setor avícola, incluindo serviços oficiais governamentais, não governamentais, empresas, Universidades e Institutos de Pesquisa. Estão todos atentos e dando apoio ao Serviço Veterinário Oficial para que as informações cheguem ao máximo de pessoas, que sejam realizadas ações para mitigar este risco de introdução do vírus em aves comerciais.

11: O que é estado de emergência zoossanitária?

Em maio de 2023, o MAPA declarou o estado de emergência zoossanitária em todo o território brasileiro com a detecção do vírus H5N1 da influenza aviária de alta patogenicidade em animais silvestres para que haja uma concentração de recursos humanos, financeiros e tecnológicos e os impactos da doença nos lotes comerciais e de subsistência sejam minimizados. A ideia que diferentes setores trabalhem juntos para que seja evitada a introdução do vírus em lotes comerciais.

12: Há chance de pandemia?

Atualmente o risco é considerado baixo pela Organização Mundial de Saúde, que avalia este risco sempre após uma nova notificação. Para que o vírus seja considerado pandêmico, ele precisa ter mutações nos seus diferentes genes para a adaptação em uma nova espécie, ou um rearranjo com vírus já adaptados, para que seja capaz de ser transmitido de pessoa-a-pessoa.

A circulação maior deste vírus em animais causa uma preocupação porque aumenta as chances que mais pessoas sejam expostas e que possíveis mutações para a adaptação aos mamíferos possam surgir. Além disso já foram identificados nove casos em pessoas desde 2021 em diferentes regiões geográficas. Por isso, a vigilância genômica é importante para identificar precocemente vírus com estas mutações para limitar a dispersão viral.

13: Como evitar o contágio?

Como medida de precaução, é recomendado que as pessoas evitem manusear ou tocar aves silvestres que estejam doentes ou encontradas mortas. Devem entrar em contato com o Serviço Veterinário Oficial, que possui o treinamento e o equipamento de proteção individual apropriados para lidar com essas situações.

No caso de terem tido contato com aves infectadas ou locais onde casos de gripe aviária foram confirmados, as pessoas devem ficar atentas aos sintomas gripais (como descrito na nota técnica do Ministério da Saúde) por um período de dez dias e buscar atendimento no serviço de saúde local, se necessário.

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