As dores nas costas atingem 80% da população mundial, segundo a Organização Mundial da Saúde. Para falar sobre o tema, Paulo Viana entrevistou o neurocirurgião Alisson Teles, do Hospital São José, no Complexo Hospitalar da Santa Casa de Porto Alegre, e especialista em deformidades de coluna (escoliose) e cirurgias de alta complexidade.
O médico ainda fala sobre um tratamento inovador para tratamento de coluna que vem sendo realizado na instituição desde maio.
Existe diferença entre dor nas costas e dor na coluna?
Popularmente, os termos são utilizados como sinônimos.
Quais são as principais causas de dores nas costas?
Dor nas costas pode ter diversas causas. Entretanto, a maioria das pessoas (>85%) tem o que chamamos de “lombalgia inespecífica”. Esse termo significa que não há uma doença específica ou anormalidade na coluna causando a dor.
Muitas pessoas atribuem a dor nas costas a discos degenerados e artrose, embora problemas nos músculos, ligamentos ou outras causas podem também ser as responsáveis pela dor. Muitas estruturas das costas podem gerar dor e nem sempre os médicos conseguem distinguir qual estrutura está causando a dor em cada caso, por isso frequentemente usamos o termo lombalgia inespecífica.
Raramente, a dor nas costas é causada por uma doença séria na coluna como uma infecção, fratura, tumor ou um problema neurológico conhecido como síndrome da cauda equina, que causa fraqueza nas pernas, dificuldade para urinar e defecar além da dor nas costas. Dor nas costas que corre para a perna, formigamento ou fraqueza pode ser causada por hérnia de disco ou estenose da coluna.
Quais são os problemas na coluna mais comuns atualmente?
Alguns diagnósticos comuns para o cirurgião de coluna são:
Discopatia degenerativa, que é o desgaste ou “envelhecimento” dos discos intervertebrais.
Artrose facetária, que consiste na existência de artrite nas articulações (juntas) que conectam uma vértebra na outra na região posterior da coluna. Isso pode causar formações ósseas na faceta articular e dor nas costas.
Espondilolistese, que é quando uma vértebra se desliza sobre a outra. Espondilolistese é geralmente causada por estresse nas articulações da coluna lombar e muitas vezes está associada a artrose facetária.
Hérnia de disco, são rasgos na parte externa do disco podem levar a uma hérnia de disco, quando o material gelatinoso do meio do disco sai para fora dele pelo rasgo da parte externa. Hérnia de disco pode causar dor na perna ou fraqueza se a hérnia comprime a raiz nervosa.
A protrusão do disco é menor que a hérnia e é visto em cerca de 50% das pessoas sem dor nas costas. A maioria das protrusões do disco não causam sintomas, mas ocasionalmente podem causar irritação das raízes nervosas.
Estenose do canal lombar, que consiste no estreitamento do canal vertebral (o espaço por onde passam os nervos na coluna). Isso é geralmente causado por protuberâncias ósseas (bicos de papagaio), que ocorrem mais comumente em pessoas idosas.
Escoliose degenerativa: escoliose é quando a coluna faz uma curva lateral de mais de 10 graus. Ela é causada geralmente por artrose e discopatia degenerativa em seus estágios avançados. Algumas vezes as pessoas com escoliose degenerativa também apresentam estenose do canal lombar, espondilolisteses e hérnias de disco. Cerca de 50% das pessoas com mais de 60 anos têm escoliose degenerativa e a maioria delas tem poucos sintomas.
Entretanto, escoliose degenerativa é uma causa comum de dor nas costas em pessoas com idade avançada.
Causas menos comuns: raramente dor nas costas é causada por uma doença séria da coluna como uma infecção, tumor ou doença conhecida como síndrome da cauda equina, que causa fraqueza e dificuldade de urinar ou defecar além da dor nas costas. Outra causa de dor nas costas é a fratura por compressão, quando uma ou mais vértebras são fraturadas devido ao enfraquecimento do osso pela osteoporose.
Em pessoas jovens, dor nas costas associada à rigidez pela manhã pode estar associada com uma doença inflamatória conhecida como espondilite anquilosante.
Que tipo de exames são realizados para diagnosticar a causa?
Em situações específicas, alguns exames de imagem podem ser recomendados pelo médico, como:
Raio X: pode ser recomendado em situações específicas principalmente para pacientes com risco para osteoporose, para detectar fraturas em compressão, em pacientes com história de câncer, e também servem para diagnosticar escoliose. O raio X não mostra hérnia de disco ou estenose do canal lombar.
Tomografia computadorizada e Ressonância Magnética: são exames mais detalhados dos ossos e dos tecidos moles que compõem as costas. A ressonância é geralmente necessária para diagnosticar hérnia de disco ou estenose do canal lombar. Um desses exames pode ser recomendado se o paciente apresenta algum sinal de infecção ou câncer, se a cirurgia está sendo considerada, ou se a dor nas costas persiste por mais de 4 a 6 semanas e a causa não pode ser determinada por outros métodos.
O que pode ser feito para prevenir os problemas de coluna?
Há inúmeras formas de prevenir esses episódios de dor. As principais delas são se manter ativo e realizar exercícios físicos. Atividade física deve combinar atividade aeróbica para melhorar o sistema cardiovascular e atividades de exercícios específicos para fortalecimento dos músculos das costas, quadris e do abdome. Além disso, se manter no peso ideal e não fumar ajudam a prevenir desgastes na coluna.
A dor nas costas pode ir embora por conta própria?
A maioria das pessoas com essas dores melhora em 4 a 6 semanas sem nenhum tratamento específico ou com medidas simples caseiras.
Quando é recomendável consultar um médico?
O médico deve ser consultado sempre que o paciente apresentar:
– Dor nas costas em pessoas idosas que nunca tiveram dor nas costas.
– Dor que não melhora sozinha, mesmo durante a noite ou quando a pessoa está deitada.
– Fraqueza em uma ou ambas as pernas, problemas para urinar, defecar ou disfunção sexual podem ser sintomas de síndrome de cauda equina. Se houver algum desses sintomas, um médico especialista em coluna deve ser consultado com urgência.
– Dor nas costas acompanhada de febre ou emagrecimento.
– História de câncer, baixa imunidade, osteoporose, ou uso de corticóide por um período prolongado de tempo.
– Dor nas costas depois de um acidente como queda ou acidente de carro.
– Dor irradiada para a perna, principalmente se acompanhada de fraqueza na perna.
– Dor nas costas que não melhora em 4 semanas.
O que há de inovador em cirurgia de coluna?
Nos últimos anos, temos visto inovações em diversas etapas de uma cirurgia de coluna: desde a seleção dos pacientes para algum determinado tipo de cirurgia, até a precisão e segurança da cirurgia e também na recuperação dos pacientes após uma cirurgia de coluna.
Por exemplo, a seleção dos pacientes que se beneficiam de algum determinado tipo de cirurgia têm sido melhorada com a utilização de inteligência artificial e modelos estatísticos de predição de bom resultado. Através de uma extensa análise de diversos fatores, conseguimos entender quais são as chances de sucesso e de fracasso em uma eventual intervenção cirúrgica. Isso auxilia muito os pacientes a tomarem decisões de prosseguirem ou não com uma cirurgia.
Algumas inovações na cirurgia são as técnicas de descompressão tubulares e endoscópicas da coluna. Essas técnicas beneficiam pacientes com pinçamento de nervos na coluna. São técnicas minimamente invasivas que geralmente podem ser feitas em regime ambulatorial, sem necessidade de internação hospitalar. Antigamente, as descompressões eram feitas com grandes incisões (cortes) e a recuperação era mais demorada.
As cirurgias de fusão também foram inovadas através de técnicas menos invasivas com incisões pequenas na região lateral do abdome, com menos dano a musculatura das costas e recuperação mais rápida.
Outras inovações são a neuronavegação (uma espécie de GPS), que auxilia o cirurgião na localização precisa das regiões da coluna; e a possibilidade de fazermos a cirurgia de coluna com anestesia regional (sem necessidade de anestesia geral ou entubação), que tem se mostrado benéfica na redução da dor pós-operatória e em efeitos adversos comuns na anestesia geral.
Quando a cirurgia minimamente invasiva é indicada? Quais as vantagens e indicações para esse procedimento realizado na Santa Casa?
Cirurgias de coluna para descompressão de nervos, fusão de vértebras (artrodese) e também de realinhamento para tratamento de deformidades podem eventualmente ser realizadas com técnicas minimamente invasivas. A indicação depende de diversos fatores, como anatomia do paciente e do problema que está sendo tratado e da experiência do cirurgião com essas técnicas.
No Hospital São José – Santa Casa de Porto Alegre, hospital de referência em neurocirurgia no Brasil, os cirurgiões do Núcleo de Neurocirurgia de Coluna buscam oferecer tratamentos minimamente invasivos sempre que possível para os pacientes.
Recentemente tivemos a oportunidade de utilizar uma tecnologia pela primeira vez no Brasil para tratamento de uma paciente com doença no nível L5-S1, o OLIF51. Através de uma pequena incisão na parte lateral do abdome, podemos realinhar a coluna e descomprimir indiretamente os nervos. Essa técnica minimamente invasiva deve beneficiar muitos pacientes com problemas de coluna.