Foto: Unicef/ONU

O convidado da coluna nesta semana é o Dr. Alceu Gomes Correia Filho.

O que é o Autismo?

O Autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento que afeta principalmente a interação social e a comunicação do indivíduo. Caracteriza-se por condutas típicas, relacionadas a rigidez de comportamentos repetitivos, baixa reciprocidade no contexto social, seletividade no repertório de vida e linguagem limitada ou muito rebuscada. Estes sintomas já aparecem nos primeiros anos de vida, sendo que os casos mais leves, muitas vezes acabam sendo diagnosticados mais tarde.

Por que atualmente o autismo é chamado de TEA?

A expressão espectro foi incluída nas últimas versões de classificação, uma vez que o transtorno pode apresentar diferentes níveis de comprometimento e uma constelação de sintomas comportamentais e de linguagem, por este motivo chama-se Transtorno do Espectro Autista.

Qual é a causa do autismo?

Não existe uma causa única, atualmente a melhor hipótese refere-se a uma transtorno que envolve aspectos constitucionais do indivíduo  e fatores ambientais como gatilhos. Assim, se há um caso de TEA na família, a chance de haver novos casos é maior do que a população em geral.

Quais os sintomas de autismo?

Os sintomas mais evidentes são padrões de comportamentos repetitivos estereotipados, déficits na aquisição ou uso da linguagem, rigidez de comportamento, baixa reciprocidade no contexto social.

Como é feito o diagnóstico?  Existe algum exame para que confirme o autismo?

Até o momento não há nenhum exame que seja específico que detecte todas as formas do espectro. O diagnóstico é clínico, pode ser feito por um psiquiatra ou neurologista. As avaliações multidisciplinares são as mais adequadas, assim o psicólogo, o terapeuta ocupacional, ou fonoaudiólogo fornecem importantes subsídios para a determinação do diagnóstico. Existem vários questionários e testes clínicos que podem rastrear os casos suspeitos. A entrevista com pais e cuidadores é fundamental para se ter um histórico.

Com que idade o diagnóstico pode ser feito?

Como o autismo é uma variação do neurodesenvolvimento, já é possível perceber indícios nos primeiros anos de vida. Há casos em que o diagnóstico acaba sendo detectado tardiamente, pois os prejuízos e sintomas são mais leves.

Existem diferentes graus de autismo?

Sim. Existem 3 níveis de intensidade que são considerados níveis de suporte. Desde o nível 1 mais leve, até nível 3 mais severo.

Desconfio que meu filho tenha autismo, o que eu devo fazer?

Primeiramente levar a um pediatra para uma avaliação clínica geral. Nos casos mais evidentes indica-se uma avaliação com o psiquiatra, neurologista ou psicólogo. O importante é que a criança seja vista por algum profissional da área da saúde que tenha uma boa formação e que conheça aspectos do desenvolvimento normal das crianças.

Autismo tem cura?

Uma vez detectada esta condição a mesma acompanhará o indivíduo por toda a vida, o que não quer dizer que esta pessoa não possa levar uma vida com autonomia plena, podendo trabalhar, estudar e manter relacionamentos. Assim a pessoa com TEA irá necessitar suporte psico-social continuado.

Por que o tratamento precoce é importante?

Porque existem aquisições na maturação do cérebro que se não forem realizadas no momento oportuno, mesmo com a plasticidade cerebral, podem ocorrer podas que geram limitações por longo tempo.

A família também deveria fazer terapia?

A família deve receber suporte emocional para lidar com a elaboração do diagnóstico e manejo dos sintomas, bem como lidar com os desafios de interação social da pessoa com TEA.

A pessoa com autismo conseguirá trabalhar quando adulta?

Dependendo da evolução do caso é possível sim que a pessoa tenha condições de autonomia laboral. Um autista, assim como qualquer pessoa, tem ideias e aspectos vocacionais próprios.

Homens e mulheres possuem as mesmas chances de desenvolver autismo?

O autismo é mais prevalente em meninos do que em meninas, sendo duas vezes mais em homens.

Quais são os direitos e benefícios sociais dos autistas?

Atualmente há uma série de direitos conferidos a pessoa com autismo. Tanto para as famílias mais vulneráveis (BPC), como para a população autista em geral – recentemente em Porto Alegre foi aprovada a lei que desobriga a atualização dos laudos, ou seja uma vez emitido o Laudo de TEA, a pessoa não necessita renová-lo.

O papel da família ao lidar com o autismo?

Cabe a família receber orientações de manejo e cuidado para auxiliar a pessoa com TEA a enfrentar as dificuldades que se impõem na esfera acadêmica e social.

Qual a importância de conscientizar a sociedade sobre o autismo?

Principalmente a sociedade precisa estar atenta para o acolhimento da inclusão das pessoas com TEA em todos os contextos. Considerando que a incidência tem aumentado consideravelmente, 1/36 casos, as escolas e instituições que se prepararem para esta inclusão estarão mais habilitadas a lidar com TEA e com esta realidade que se impõe cada vez mais.

Atuação do poder público é essencial para atendimento de pessoas autistas?

Cabe ao poder público monitorar e fomentar politicas públicas que atendam esta demanda. Os gestores e o legislativo precisam estar atentos à sociedade civil organizada. Há várias ONGS e associações envolvidas com a causa. Muito importante oportunizar às pessoas e familiares com TEA ao protagonismo destas ações.

A garantia do direito à educação da criança autista é um dever do estado?

Sim, cabe ao ESTADO, segundo artigo V da nossa constituição ofertar garantia de acesso à saúde e educação adaptada e priorizada às pessoas com TEA.

Qual a prevalência do autismo no Brasil?

Não temos estudos de prevalência em nosso meio, assim utilizamos estimativas de pesquisas internacionais. Atualmente estima-se que a cada 36 crianças que nascerem hoje no Brasil, uma terá sintomas compatíveis com TEA.

Famílias sofrem por dificuldade de conseguir diagnóstico e tratamento adequado de forma precoce? O que precisa mudar no sistema público de saúde?

O Ministério da Saúde ainda não oficializou os Centros de Autismo como equipamentos equivalentes aos CAPS, esta lacuna precisa receber atenção em curto espaço de tempo, para que se destinem rubricas específicas de repasse para criação e manutenção dos Centros de Referência do Autismo. O programa TEAcolhe do Governo do Estado do RS é uma iniciativa louvável e pioneira neste sentido. A prefeitura de Porto Alegre, incluiu a criação de um centro de autismo projeto prioritário desta gestão.

Existe centro de referência púbico para Autismo em Porto Alegre?

Em breve, Porto Alegre terá seu primeiro Centro de Autismo – CERTA, que está nos seus preparativos finais para inaugurar em maio deste ano. Este Centro será 100% SUS e voltado para atender a população mais vulnerável da cidade.

Quais são as principais novidades em relação ao Autismo? É possível pensarmos na cura?

Atualmente existem várias abordagens psicoterápicas que contemplam a evolução e melhor adaptação destas pessoas. Fármacos tem sido estudados no sentido de minimizar sintomas mais intensos de descontrole de impulsos e frustrações. O TEA tem sido um dos transtornos mais estudados na atualidade, com muitas publicações científicas trazendo atualizações promissoras.

Dicas para quem enfrenta os desafios de cuidar de alguém com Autismo

A primeira orientação à pessoa com autismo é a busca de uma avaliação correta e de um plano de tratamento individual específico para seu contexto. Orienta-se aos familiares a buscarem suporte nas ONGS E Associações da Sociedade Civil Organizada. É importante ter em mente que cada etapa do desenvolvimento traz desafios a todos, e que o AUTISMO não é uma sentença de limitação. A sociedade caminha para um cenário onde a pessoa com autismo e seus familiares estão cada vez mais conscientes da necessidade da inclusão, da educação da população em geral quanto aos direitos da pessoa com autismo. Esta equação ainda precisa evoluir no sentido de que: ou nos preparamos para a inclusão da pessoa com autismo ou a sociedade como um todo pagará um elevado preço por esta negligência.

 

* O Dr. Alceu Gomes Correia Filho é médico psiquiatra da Infância e Adolescência, Diretor Técnico do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas e Coordenador do CERTA – Centro de Referência do Transtorno Autista de Porto Alegre.

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