Com seis circuit breaker’s* em 10 dias, a bolsa tem tombo de mais 42% no acumulado do ano. No câmbio o dólar chegou na semana a bater a marca de R$ 5,25, fechando nesta sexta-feira (19) a R$ 5,02. Marcas indeléveis do pandemônio causado pela pandemia na economia global. O Brasil que já vinha em desaceleração deve estacionar e, em um cenário mais caótico, retroceder.

As perdas têm sido históricas nas bolsas de valores mundo afora. Na Europa, as ações despencaram a mínimas de 2012. Nos EUA, já passa de 5 trilhões as perdas no ano das empresas listadas. Estima-se que, no mundo, aproximadamente US$ 14 trilhões em valor de mercado perdidos, e até ativos seguros, como o ouro, estão sendo vendidos para compensar as perdas. Nesse cômputo, as ações mais afetadas estão as de companhias aéreas, empresas do setor de turismo, tecnologia, eletrônicos, automóveis e até alimentos.

Diversos economistas e empresários estão tentando prever o que acontecerá com a economia global nos próximos meses e anos. Instituições internacionais como FMI, OCDE, UNCTAD e economistas renomados estão projetando significativa desaceleração do crescimento mundial, no melhor dos cenários, ou uma recessão global em 2020, em cenários menos otimistas. 

A nível local, o Brasil tem a expectativa de um PIB muito abaixo daquele referente ao ano passadoestudo do Centro de Macroeconomia Aplicada da FGV (Fundação Getulio Vargas) aponta uma queda de até 4,4%. Se confirmado o que aponta o relatório, seria a maior queda nominal – que é aquela que não considera os efeitos da inflação – desde 1962, quando começa a série histórica. Este é o pior cenário apontado pelo estudo, no mediano a economia ficaria estagnada e o PIB no 0 e por último, em um cenário mais otimista o crescimento chegaria a 2,5%, o que dificilmente deve se confirmar, se considerarmos que ano passado, sem coronavírus, o PIB cresceu apenas 1,1%.  

O que ainda é uma incógnita, e um medo constante, no entanto, é de que maneira essa pandemia afetará o dia a dia, os preços dos produtos, o poder de compra de cada cidadão. Conforme explicam especialistas, se a população não tem poder de compra, a economia não gira. Nesse quesito, torna-se obrigação do Estado uma intervenção com medidas que propiciem isso.

O presidente do Sindilojas, Paulo Kruse, falou com nossa equipe de reportagem – mesmo estando em casa de quarentena:

O Sindilojas está com uma força tarefa de 15 pessoas para que todo o resto dos funcionários possam trabalhar de forma remota. Nos últimos dias, o Sindilojas Porto Alegre e o Sindicato dos Empregados do Comércio de Porto Alegre (Sindec) firmaram convenção coletiva de trabalho inédita no país estabelecendo regras específicas que facilitam a mobilidade dos trabalhadores para enfrentamento da pandemia da Covid-19.

O governo federal tem tomado medidas para reduzir os impactos, anunciou que vai injetar R$ 147 bilhões na economia nos próximos três meses. Além disso tomou medidas como  os investimentos em políticas de manutenção de empregos, liberação de pagamento do Simples Nacional, desconto no Sistema S, adiamento por três meses no pagamento do FGTS pelas empresas, entre outras ações.

O economista Denílson Alencastro acredita que as medidas que tem sido tomadas pelo governo tendem a amenizar os impactos sobre a economia. “Ainda é muito difícil mensurar tudo isso, mas as empresas precisam ter recursos. Governo tem que ajudar a dar liquidez, dar condições para que as empresas honrem com suas obrigações. Assim como transferir recursos de uma pasta para outra”, diz. Alencastro crê que é difícil evitar os impactos econômicos. “Você não vai resolver de uma hora para outra algo que não estava previsto em nenhum cenário. Não como evitar os efeitos, o que podemos fazer é minimizá-los”, salienta.

Ao contrário dele, Gláucia Campregher, professora do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS, vê diversos problemas estruturais no modo de agir e pensar a economia brasileira, principalmente em tempos de crise: “pra conseguir se recuperar dessa crise, o Brasil precisa fazer o que os outros países estão fazendo. Essa de uma ajuda de R$200,00 para os trabalhadores, o cara não vai deixar de sair de casa pra receber isso e ter que continuar pagando luz e água”.

Para explicar as medidas que deveriam ser tomadas, a economista retoma o conceito de economia de guerra: “em um contexto similar ao de guerra, o governante tem a responsabilidade de organizar os cidadãos da nação, organizar os recursos. Nos Estados Unidos já tão discutindo interferência do estado inclusive no que as empresas devem produzir para atender as demandas da população da melhor maneira possível. A China não precisou fazer nada disso porque eles já são isso e solucionaram a situação muito rápido.”

Essa importância do Estado é o que traz problemas para o Brasil hoje, é o que explica a economista. Ela destaca ainda que todos os trabalhadores da informalidade, que ganham no dia a dia o dinheiro que precisam para necessidades básicas, serão com certeza os mais afetados. O fato de essa parte da população, que não pode ficar trancado em casa, não estar sendo amparada pelo governo, está fazendo com que toda a população tenha mais risco de adoecer.

Corroborando com esse ponto de vista, está a Carta Aberta de Professores do Instituto de Economia da UFRJ: “muitos governos estão adotando medidas para: i) garantir que não haja desabastecimento de bens e insumos básicos, por meio do monitoramento das cadeias de distribuição (transportes e o comércio atacadista e varejista) e, quando necessário, de eventuais intervenções em setores produtores e importações emergenciais; e ii) estimular a economia por meio de políticas monetária, fiscal e creditícia”.

Campregher também lembra que o tempo de quarentena poderia ser utilizado inclusive para aprimorar conhecimentos políticos e econômicos pela internet.

O que há de concreto é que ainda é bem difícil prever com clareza o que está por vir. Talvez sobrem mais falidos do que mortos, talvez mais mortos do que falidos. Aos que ficarem, possivelmente restará outra guerra de sobrevivência desta vez em meio ao caos econômico.

 

*O circuit breaker é um mecanismo que interrompe as negociações da bolsa e serve para impedir oscilações muito bruscas e atípicas no mercado de ações. Esta ferramenta foi criada para amortecer e equilibrar as ordens de compra e venda dos investidores em momentos de pânico e proteger o mercado de uma volatilidade maior. Os negócios são retomados em seguida.

 

Reportagem: Caroline Musskopf e Moisés Machado 

Foto: Caroline Musskopf

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