O Dia Nacional de Conscientização sobre a Esclerose Múltipla celebrado no último dia 30 de agosto reforça a importância do diagnóstico da doença. A Esclerose Múltipla que não é uma doença comum, mas já atinge 2,8 milhões de pessoas no mundo, segundo o Ministério da Saúde. No Brasil, são em torno de 40 mil casos.
Paulo Viana entrevistou a Dra. Maria Cecilia Aragón de Vecino, Neurologista do Núcleo de Esclerose Múltipla e Doenças Desmielinizantes do Hospital Moinhos de Vento, que respondeu algumas das perguntas mais frequentes sobre o tema.
O que é esclerose múltipla?
A esclerose múltipla é uma doença do sistema nervoso central que ataca o cérebro e a medula. É uma doença autoimune, na qual a própria pessoa produz anticorpos contra essas estruturas. É uma doença neurológica crônica mais comum em jovens, mais frequente em mulheres, e é uma doença crônica e autoimune, chamada de desmielinizante.
O que causa esclerose múltipla?
Não se conhece uma causa única – e muito provavelmente essa doença não tem uma causa única. Hoje, se conhece bastante a questão genética. Existe uma codificação genética do sistema imune que faz com que exista a possibilidade de desencadear essa doença. O que não se sabe é o que ativa esse sistema imune para que ocorra a cascata inflamatória que afeta o sistema nervoso central.
E sabemos que existe algum fator ainda desconhecido por causa dos gêmeos idênticos. Gêmeos idênticos são idênticos. Então, se um desenvolve a doença, o outro deveria desenvolver a doença também – e isso não ocorre. Sabemos que eles são geneticamente iguais, o sistema imunológico foi geneticamente codificado da mesma forma, mas algum outro fator faz com que esse sistema seja ativado e a doença se instale. Então, atualmente, conhecemos uma parte do que causa, mas não tudo.
Quais são os tipos de esclerose múltipla?
Existem três tipos – e esses tipos podem ser subdivididos. O mais importante é saber que a maioria evolui em surto-remissão ou remitente recorrente. No caso desses pacientes, a pessoa está bem, tem uns sintomas, dá uma piorada e se recupera, voltando a ficar bem. Isso pode se repetir várias vezes. Existem outros casos em que a pessoa, depois de um tempo em surto-remissão, não melhora tanto.
Há uma melhora considerável, mas não a recuperação esperada. Também há casos em que as pessoas não têm exatamente surtos, momentos mais agudos, mas sim uma piora progressiva. Esse é o grupo que chamamos de secundariamente progressivo, no qual a recuperação não é tão boa ou inexiste, havendo piora lentamente progressiva. E existe uma minoria de pacientes que são chamados de primariamente progressivos.
Esse grupo não chega a ter resultado, não tem agudização da doença – eles pioram aos poucos. É um grupo diferente em vários sentidos, mas é um caso em que não há “sobe e desce, melhora e piora”, em nenhum momento. Eventualmente até pode haver uma piora mais aguda, mas, de modo geral, são pacientes cuja doença vai piorando lentamente.
Qual é a predominância da esclerose múltipla?
A esclerose múltipla é uma doença mais frequente em mulheres do que em homens – em uma proporção que vai de dois para três, e é uma doença de jovens. O período de maior apresentação da doença é entre os 20 e os 40 anos. Mas, claro, temos pacientes ainda mais jovens que apresentam a doença, em casos pediátricos, e também temos pacientes que são diagnosticados depois dos 40 anos.
Quais os sintomas da esclerose múltipla?
Os sintomas da esclerose múltipla são literalmente múltiplos. Como afeta todo o sistema nervoso, é possível ter manifestações em qualquer das coisas que são controladas pelo sistema nervoso – podemos ter alterações visuais, vertigem, perda de força, alteração de sensibilidade, problemas de equilíbrio. São várias possibilidades.
Não existe um sintoma que nos direciona especificamente, mas a suspeita clínica fundamentalmente deve partir do ponto de que surja um sintoma neurológico que seja persistente, não necessariamente agudo, como no AVC, mas que seja persistente e que não tenha uma boa explicação.
Isso é algo muito importante. Isso porque, às vezes, é difícil para que as pessoas liguem os pontos, porque alguns dos sintomas são facilmente explicáveis. Basicamente, os sintomas são muitos, e é preciso estar atento ao que sai do normal, que não foi repentino, mas que saiu do normal e custou a se normalizar.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico da esclerose múltipla talvez seja um dos complexos na neurologia. Primeiro, porque exige que o paciente tenha uma história clínica compatível. Então, o primeiro ponto é que a forma como os sintomas se apresentaram precisam ser compatíveis com aquilo que se encontra na doença.
A segunda questão é que é preciso excluir outras doenças que causam sintomas semelhantes ou que tenham resultados radiológicos semelhantes. O que conclui o diagnóstico é a ressonância magnética, que tem critérios muito específicos para determinar se é esclerose múltipla ou alguma doença semelhante. Então, basicamente, o diagnóstico é feito por história clínica e ressonância.
Esclerose múltipla tem cura?
A esclerose múltipla não tem cura e é uma doença crônica. Não é uma doença que dura pouco tempo porque, depois que ocorre o diagnóstico, as pessoas terão essa doença para o resto da vida, assim como outras doenças crônicas, como artrite reumatoide, por exemplo. Então, não há cura, mas há tratamentos bons e eficazes para que essas pessoas literalmente convivam com a doença dentro da maior normalidade possível.
A esclerose múltipla é contagiosa?
A esclerose múltipla não é contagiosa de jeito nenhum, em hipótese alguma.
Como é o tratamento da esclerose múltipla?
O tratamento da esclerose múltipla é feito com drogas chamadas modificadoras da doença. São drogas específicas para a esclerose múltipla. Temos várias possibilidades de drogas – injetáveis, comprimidos, há uma ampla variedade. Temos acesso a esses medicamentos pelo SUS, com fornecimento pelo Ministério da Saúde, e pelos planos de saúde também.
É possível prevenir a esclerose múltipla?
Infelizmente, não é possível prevenir a esclerose múltipla. Nenhuma doença autoimune é realmente prevenível. É importante pensar que, a partir do momento em que o paciente é diagnosticado com uma doença crônica, ele precisa se cuidar para não desenvolver outros problemas, outras doenças. Por outro lado, alguns fatores são específicos, por exemplo, fumar, para mulheres, é um fator conhecido de piora de prognóstico.
Obesidade em jovens é outro fator que sabemos que pode piorar o prognóstico. Então, não é possível prevenir, mas, depois do diagnóstico, é preciso cuidar de si e evitar as coisas que praticamente todo mundo tem de evitar. É preciso buscar estabelecer uma rotina de exercícios, levar uma vida saudável, com alimentação equilibrada.
Ninguém vai ficar proibido de fazer coisa nenhuma, mas vai ser chamado a fazer coisas melhores, a comer melhor, a dormir melhor, a se alimentar melhor. Exige mais autocuidado.