A importância da imunização contra o vírus HPV na adolescência. Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

Desde 2014 já está disponível no Brasil a vacinação contra o Papilomavírus Humano (HPV). Porém, levar a proteção contra essa doença a crianças e adolescentes tem sido um esforço que com resultados muito aquém do esperado.

De acordo com dados da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), em 2021 apenas 37% dos adolescentes do sexo masculino receberam essa vacina no país, enquanto a meta do Programa Nacional de Imunizações (PNI) é imunizar 80% desse publico alvo.

A importância da imunização contra esse vírus nos adolescentes se dá pelo fato de que parte de seus sorotipos são consideradas cancerígenas, e a proteção da vacina é maior quando aplicada antes do início da vida sexual. Como o HPV pode ser transmitido mesmo com o uso de preservativo, a vacina acaba sendo considerada a forma mais eficaz de prevenção.

A associação do HPV ao câncer supera a de outros agentes infecciosos conhecidos, como os vírus da Hepatite B e C, que podem causar câncer de fígado e leucemia; a bactéria Helicobacter pylori, associada a câncer de estômago, esôfago, fígado e pâncreas; e o vírus Epstein-Barr (EBV), cuja infecção pode evoluir para linfomas e carcinoma nasofaríngeo.

Por conta de sua grande circulação, prevenir o HPV se torna ainda mais importante na sociedade. Os estudos do Instituto Nacional de Câncer indicam que 80% das mulheres que possuem uma vida sexual ativa serão infectadas em algum momento de suas vidas, e esse número pode ser ainda maior em homens.

Dados estimam que entre 25% e 50% da população feminina e 50% da masculina mundial estejam positivadas pelo HPV. porém, a grande maioria dessas infecções são combatidas de forma espontânea pelo sistema imune, regredindo entre seis meses a dois anos após a exposição, principalmente entre o público feminino jovem.

O vírus mais cancerígeno

Flávia de Miranda Corrêa, pesquisadora da Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede (Didepre) do Instituto Nacional de Câncer (Inca), conta que de acordo com a descrição da medicina, o HPV é o agente infeccioso que tem mais associações ao câncer.

Na mulher, o vírus é o principal causador do câncer de colo de útero e também está relacionado a câncer na vulva e vagina. No público masculino, cerca de metade das neoplasias no pênis partem a partir de uma infecção causada pelo HPV. Além disso, o câncer de anus e de garganta (orofaringe) entram na lista.

“O HPV é um vírus sexualmente transmissível. Então, a transmissão se dá no contato da pele com a pele, mucosa com mucosa, pele com mucosa”, explica a pesquisadora, que por isso afirma que a vacinação é a principal forma de proteção contra o vírus.

“A camisinha protege só o pênis. Ela não vai cobrir a bolsa escrotal, não vai cobrir o ânus, não vai impedir o contato da pele com a pele. E também não é comum que se use camisinha desde o início da relação sexual, em massagens, por exemplo. É claro que ela deve ser utilizada porque diminui a possibilidade de contágio, não só pelo HPV, mas por outras infecções. Mas ela não é garantia de que não vai haver infecção pelo HPV”.

A vacina de combate ao HPV deve ser aplicada em meninas e meninos na faixa etária de 9 a 14 anos, em duas doses. A segunda deverá ser aplicada seis meses após a primeira. Essa vacina protege contra os vírus dos sorogrupos 8, 11, 16 e 18, sendo os dois últimos os principais causadores de câncer.

“A vacinação antes da exposição ao vírus é a melhor maneira de evitar a infecção. A vacina é altamente eficaz e contém os vírus mais prevalentes”, afirma ela, que reforça a necessidade da vacinação na idade recomendada pelo PNI:

“A vacina vai ser eficaz se a pessoa ainda não tiver tido contato com aqueles vírus presentes na vacina. Ela previne, ela não trata. Além disso, a resposta imunológica é melhor nos jovens, quanto mais cedo a vacinação for aplicada, eles desenvolvem uma resposta melhor”.

Número de países que já iniciaram a vacinação contra o HPV há mais tempo que o Brasil, como a Austrália, mostram que a imunização já reduziu a incidência dos casos como verrugas, lesões precursoras e do próprio câncer. “Para a gente falta um pouco, até porque nossa cobertura não está excelente”, relata Flávia.

Oito em cada dez casos de câncer

Uma das principais causas de mortes de mulheres, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, é o câncer cervical, que está associado ao HPV em mais de 80% dos casos. Sete em cada 10 casos desse tipo de câncer são resultado de infecções persistentes pelos vírus HPV-16 e HPV-18, e 15% são causados pelos tipos HPV-31, 33, 45, 52 e 58.

A cada ano, cerca de 83 mil mulheres, nas Américas, são diagnosticadas com câncer cérvico uterino e mais de 35 mil mulheres morrem pela doença, a grande maioria antes dos 60 anos.

A evolução desses casos depende muito do quão rápido eles são diagnosticados. Quanto mais precoce for a detecção, maior a chance de cura e menor o sofrimento do paciente. Além de salvar a vida, a rapidez no diagnóstico também reduz a possibilidade de sequelas, como cirurgias mutiladoras nos órgãos afetados, explica a pesquisadora do INCA.

“No câncer do colo de útero e de ânus, que têm lesões precursoras, lesões malignas, a gente pode tratar essas lesões precocemente e o câncer nem se desenvolver. Para o câncer de colo do útero tem o rastreamento, que permite detectar essas lesões ou o câncer em estágio inicial”, explica.

“Se for identificado em estágio avançado, vão ser necessárias cirurgias mutiladoras, pode ocorrer uma sobrevida com pouca qualidade de vida, e um maior risco de mortalidade. Por isso, a gente tem que pensar que a vacinação tem esse benefício enorme, não só para as mulheres”.

Como tratar

Quando infectados pelo vírus, a pessoa deve tratar os sintomas para que eles não consigam evoluir para um quadro de câncer. Pode demorar anos para a presença do vírus se manifestar, sendo detectada pela presença de verrugas ou lesões na pele das mucosas.

Podem ser usados laser, eletrocauterização, ácido tricloroacético (ATA) e medicamentos que melhoram o sistema de defesa do organismo. Não há tratamento específico para eliminar o vírus, e o manejo da doença se concentra em combater as verrugas, dependendo da extensão, quantidade e localização das lesões. Em geral, o tratamento é feito com ginecologistas, urologistas ou proctologistas, mas outros especialistas também podem ser necessários.

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